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Candidato negro pode ter mais verba durante eleições

Há uma consulta em análise no TSE
com a discussão sobre a reserva de recursos do Fundo Eleitoral (e de tempo de
rádio e TV) para viabilizar as campanhas
Agência Estado –
Verba pública soma R$ 2 bi para
eleições municipais
TSE / Divulgação
Mesmo sendo maioria da população
brasileira, negros representaram apenas 24% dos deputados federais escolhidos
pelo voto popular em 2018. Uma consulta em análise pelo TSE (Tribunal Superior
Eleitoral) pode mudar esse cenário, com a discussão sobre a reserva de recursos
do Fundo Eleitoral — e de tempo de rádio e TV — para viabilizar as campanhas de
candidatos negros e negras.
A verba pública, que nas eleições
municipais deste ano soma R$ 2 bilhões, seria dividida segundo o critério
racial, obedecendo a proporção de candidatos negros e brancos de cada partido.
O objetivo é usar o dinheiro do
fundo para corrigir distorções históricas e evitar que os partidos favoreçam
políticos brancos. Segundo um estudo da FGV Direito São Paulo, homens brancos
representaram 43,1% de todos os candidatos a deputado federal nas eleições de
2018, mas concentraram cerca de 60% das receitas de campanha. Por outro lado,
as mulheres negras – que somaram 12,9% das candidaturas à Câmara – ficaram com
apenas 6,7% do volume total de recursos. Elas sofrem dupla discriminação:
recebem menos recursos que os homens por serem mulheres, e menos que as
mulheres brancas.
Congresso promulga PEC que adia
eleições municipais para novembro
“A sociedade brasileira é
racista, e a estrutura partidária reproduz o racismo. O interior dos partidos
não é necessariamente democrático, e quem está nas mesas diretoras, no comando
das decisões, são homens brancos”, observou o cientista político Cristiano
Rodrigues, da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais).
Rodrigues aponta que, na
distribuição dos recursos, as siglas tendem a privilegiar os candidatos que
mobilizam mais dinheiro (como empresários) e aqueles que são provenientes de
famílias com forte tradição política. “A população negra está mais ausente
desses espaços.”
Cota
No caso das mulheres, a
legislação eleitoral prevê uma cota mínima de 30% de candidaturas femininas nas
eleições para os cargos de deputados federais, estaduais e vereadores. No
entanto, não há nenhum dispositivo legal que obriga os partidos a lançarem um
número mínimo de candidatos negros. Ao entrar com a consulta no TSE, a deputada
federal Benedita da Silva (PT-RJ) pediu que o tribunal estabelecesse uma cota
de 30% de candidaturas negras para cada agremiação. A medida foi rejeitada pelo
relator do caso e presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso, para quem
uma iniciativa nesse sentido depende de lei a ser aprovada pelo Congresso.
O ministro, no entanto, acolheu
outros pedidos da consulta. Barroso quer que a “fatia feminina” do Fundo
Eleitoral e do tempo de rádio e TV sejam divididos entre candidatas negras e
brancas na exata proporção das candidaturas apresentadas por cada partido. O
mesmo critério deve ser adotado para homens negros e brancos.
“A ordem constitucional não
apenas rejeita todas as formas de preconceito e discriminação, mas também impõe
ao Estado o dever de atuar positivamente no combate a esse tipo de desvio e na
redução das desigualdades de fato. Há um dever de integração dos negros em
espaços de poder, noção que é potencializada no caso dos parlamentos. É que a
representação de todos os diferentes grupos sociais no parlamento é essencial
para o adequado funcionamento da democracia”, disse Barroso. O ministro
Edson Fachin acompanhou o entendimento do colega.
O julgamento, iniciado na última
terça-feira, foi interrompido por um pedido de vista (mais tempo para análise)
do ministro Alexandre de Moraes. Moraes concordou com o entendimento dos
colegas sobre o problema do racismo no País, mas alertou para os riscos de a
reserva de recursos e de propaganda eleitoral para candidatos negros gerar um
efeito contrário: a retaliação desses candidatos pelos próprios partidos.
“Por não existir um mínimo
legal de candidaturas, seja de mulheres negras, seja de homens negros, em tese,
haveria a possibilidade de retaliação partidária, de não se admitir mais
candidaturas. A minha análise é para verificar um mecanismo para impedir isso
(a retaliação)”, comentou Moraes.
Como a discussão está suspensa
por tempo indeterminado, não é possível saber se o entendimento a ser firmado
já valerá para as eleições de novembro. Na atual legislatura, as mulheres
negras representam apenas 2,5% do total de eleitos na Câmara dos Deputados,
enquanto as mulheres brancas são 12,28%, os homens negros 22,02% e os homens
brancos 62,57%, segundo o estudo “Democracia e representação nas eleições
de 2018”. O levantamento apontou que 26% das candidaturas a deputado
federal eram de homens negros, mas esse grupo recebeu apenas 16,6% do total dos
recursos.
“É mais do que oportuna (a
consulta). Se efetivamente quisermos criar políticas públicas e legislação para
fomentar comportamentos antirracistas, precisamos de representantes negros no
Congresso”, disse a professora Luciana Ramos, uma das coordenadoras do
estudo.
Autora da consulta ao TSE,
Benedita opina que a discussão não é sobre privilégios. “Queremos que o
Parlamento espelhe a representação da sociedade”, disse. Contrária ao uso
de dinheiro público por partidos, a deputada Adriana Ventura (Novo-SP),
ressalta que “não adianta garantir vagas por gênero ou raça se o Fundo
Eleitoral é gerido por critérios dos partidos, normalmente obscuros e
injustos”.

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